Quase todos os anos é a mesma coisa, em Marabá. Nos meses de inverno, os rios sobem e invadem a cidade.
Sem pedir licença, as águas chegam de mansinho e vão ocupando praças, quintais, ruas, avenidas, bares, igrejas, prédios de madeira ou alvenaria, sejam eles públicos ou particulares.
Os rios só têm um critério para definir quem será ou não visitado: o nível da superfície terrestre. E os homens sabem disso desde os tempos mais remotos. Por isso, sempre que as águas chegam, saem aos atropelos procurando, instintivamente, os lugares mais elevados.Quando começa a vazante, quase que invariavelmente, as águas vão e os homens voltam.
Quem saiu de casa carregando cacos e cacarecos, volta a rigor carregado de saudades.
Inexplicavelmente, a enchente tem esse magnetismo. Quanto mais ela castiga, mais o flagelado se pega perdidamente apaixonado por ela.
Não importam os móveis estragados, o colchão ensopado, os sapos e cobras trazidos na chegada. Tampouco a lama, o mau-cheiro, vermes e insetos deixados na saída. A vida continua; sem ressentimentos. Afinal, o rio é generoso – chega e sempre sai calado, sem resmungar. Não obstante, expulsa o morador de casa apenas por algumas semanas e, no final das contas – se isso parece pouco –, ainda espera um ano todinho, pra voltar a perturbar de novo.
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